por Rosyane Silwa
Eu sou uma mulher cis, negra retinta, no dia do Demo Day (11.12.2020), usava um óculos grande com armação bem estreita e com cor rosa bem claro, estava com Turbante e roupas brancas pois era sexta feira, Dia de Oxalá. Estava com um fone branco nas orelhas. Peço licença aos meus mais velhos, aos mais novos. Benção pra quem é de benção!
Sou Rosyane Silwa, produtora cultural, jornalista, Mestre em História, CEO e paridora da Compre de uma mãe preta, que é a primeira vitrine virtual de mães negras (pretas e pardas, afro indígenas, indígenas, imigrantes e refugiadas negras, empreendedoras em produtos e serviços em diversos segmentos.
Nós focamos em facilitar a utilização de ferramentas para as vendas, fortalecemos a divulgação e damos visibilidade aos negócios de cada mãe. Fortalecemos a autoestima e somos comunidade e rede de apoio.
A equipe da Compre de uma MÃE PRETA é composta por mim Rosyane e a Tuanny Miller, somos CEOs e Fundadoras, Ana Paula Peres e Natany Luis cuidam da comunicação e redes, Alexandra no Financeiro, Michele nas Vendas e Daisy no design e na fotografia.
Depois que eu e a Dani Junco escolhemos as palavras - ela Resiliência e eu Oportunidade - fiquei pensando o que ela significava pra mim.
Vim falar De e Sobre oportunidades, então fui buscar ao fundo o que essa palavra poderia significar. No dicionário, significa “favorável, adequado, desejável”, "a capacidade de fazer uma coisa adequada no momento oportuno".
Olhei para minha história e vi que sou fruto de oportunidades, apresento minha linhagem, mulheres que foram responsáveis pela minha trajetória: Rosangela, Maria Gustavo, Maria Maura, Fernandina Maria, Maria José, Jovelina, Maria da Conceição, Tuanny e Betânia.
Minha presença aqui é pela oportunidade que tenho em trazer a ancestralidade em mim. Tenho uma família grande e afetuosa, unida, e “também muito ouriçada”. Meu pai, um homem negro retinto, que há 35 anos atrás se formou em letras em uma universidade privada. Resistência e Oportunidade!
Também de uma mãe que fez supletivo e mesmo depois de 3 filhos concluiu o ensino médio e me ensinou como me defender de ataques racistas. Meus pais me deram as possibilidades de ter uma estrutura familiar e acesso a educação.
Oportunidade sem educação é impossível!
Então depois de 300 de escravidão e somente 130 pós abolição, em 2018, nós - pretos e pardos - passamos a representar 50,3% dos estudantes do ensino superior da rede pública, avançamos por conta de politicas publicas como as cotas raciais, bolsas, etc - segundo a pesquisa publicada pelo IBGE.
Mas vou precisar falar sobre a falta dessa oportunidade: Nós mães negras estamos enterrando nossos filhos, em cada 10 jovens mortos, 7 são negros, essa semana enterramos Emily e Rebeca, com 2 tiros certeiros. Em 2020 foram 12 crianças mortas com Balas perdidas, balas que tem o alvo certo, tem cor, tem endereço. Quando mata-se um filho, mata-se uma mãe, e também mata a oportunidade de toda uma comunidade.
Parem de matar nossas crianças pretas!
A oportunidade me parece ingrata
Voltando a oportunidade boa, sou mãe de Rainha! E essa eu fiquei em dúvida, sem saber se era oportunidade, benção, loucura ou amor. Acho que é tudo junto! Eu e o João Paulo, vulgo o Mozão, escolhemos o mesmo nome de uma Rainha Angolana, que lutou e construiu uma nação, a mais criadora de oportunidades da sua época, principalmente no empreender e sobreviver!
Rainha Nzinga Mbandi!
Agora estou falando da oportunidade que tenho em registrar, reescrever e reviver histórias que foram apagadas no processo de embranquecimento e escravidão que o Brasil foi construindo enquanto sociedade. Oportunidade de falar sobre uma população escravizada que trouxe saberes e tecnologias para o Brasil. Mas que foi desumanizada e mesmo depois da abolição, não foi indenizada, nem recebeu políticas de reparação, nem heranças, nem condições de vida digna. Essas pessoas que foram consideradas desalmadas, foram escolhidas no continente africano literalmente a dedo, por seus saberes e expertises. Ou vocês ainda acreditam que foram os extraterrestres que construíram as pirâmides do Egito?
Falo sobre mulheres negras que são as principais responsáveis pelo mercado que alimenta e constrói esse Brasil, a base da pirâmide. Quiçá, digo com autoridade que foram as criadoras do empreendedorismo. A Compre de uma MÃE PRETA, é fruto dessa oportunidade, embora esse processo tenha nascido em condições escravocratas.
Elas que eram as negras de ganho, amas de leite e são as baianas do acarajé. Sou herança e tenho a Oportunidade de poder estar aqui agora contando tudo isso. Atualmente 54% da população negra se autodeclara preta e parda; 4,7 milhões de mulheres negras são Donas de empreendimentos. Ainda assim, as mulheres negras ganham 49% menos que as mulheres brancas e 159 vezes menos que um homem branco, mesmo que a população negra movimente 704 bilhões por ano no Brasil. ( IBGE, Empreendedorismos Negro no Brasil)
Pelas disparidades e desigualdades sociais entendemos que: Nem todo mundo tem oportunidade e nem chance! Todas nós que estamos na Pulse 8, estamos tendo oportunidades de criar um mundo diferente. Quem sabe um novo tempo onde empresas sejam tão diversas e respeitosas que não precisem criar um comitê de diversidade, porque já está ali no DNA um pacotão de gente: gente preta, gente gorda, gente LGBTQIA+, gente com deficiência, gente com endereço na periferia, gente mãe.
Se bem que aí a Compre e a B2mamy perdem um nicho - a maternidade (risos). A oportunidade e a chance me foram lançadas, me desafiei junto com a Tuanny de estar aqui. O pulse foi uma pulsação enérgica do começo ao fim, choramos, debatemos, recebemos apoio, aprendemos, resistimos, pivotamos, nos adaptamos e conhecemos pessoas incríveis, Biba e Marina - não soltamos mais as mãos - nossas dores nos uniram.
Vivenciamos alguns momentos tensos, porque falar sobre racismo é difícil, é aquela palavrinha chata, que enche o saco, que interrompe aula e levanta várias discussões, mas que mata, adoece e tira as oportunidades de muitas pessoas. Então é necessário falar e agir sobre e muito! Quais vidas importam? Quem tem o privilégio de sair vivo de um supermercado?
A Compre nasce dessa dor profunda que só o racismo sabe causar! Mas nasce também com uma energia louca de sobreviver e não perder nenhuma oportunidade. Para mim estar em lugares onde a maioria não se parece comigo, dá medo! Porque tenho que estar atenta e na maioria das vezes enfrentar alguma questão racial! Sim, em todos os lugares! Infelizmente. Mas como não tenho tempo pra adoecer e desistir, me surge a necessidade de escolher qual luta e qual energia eu vou querer gastar, já precisou escolher? Minha escolha foi me jogar!
Estar no Pulse 8 infinito, foi uma grande oportunidade, onde todas essas mulheres se comprometeram e dedicaram horas para compartilhar, aprender e se dedicar a um sonho. Porque um negócio, nada mais é o que nós sonhamos e que acreditamos ser uma ótima oportunidade de mudar algo para alguém.
No fim estamos conectadas de alguma forma, talvez não pelo negócio, ou pelas crenças, mas pela nossa verdade e vontade de ser melhor!
Fizemos amizade, conexões e muitas parcerias. A B2Mamy nos abriu vários canais, nos conectou com forças motoras. Com as Wombers e também com as B2Manas.
A minha mensagem é um pedido de escuta, de ação e junto com a empatia : alteridade! Que as pontes continuem a serem construídas e que mais das minhas manas pretas estejam daqui, daí, em todos os lugares. Tem um provérbio africano que diz: Quer ir rápido vá sozinha, se quer ir longe vá em grupo.
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